PONTO
ELETRÔNICO NA JFRN - CASA DE FERREIRO, ESPETO DE PAU
Silvana
Gruska*
A Justiça Federal do RN é a única Seção Judiciária do país que utiliza
para os Oficiais de Justiça o controle de freqüência por meio de biometria
digital, comumente chamado de ponto eletrônico. Tal procedimento, imposto a
esses servidores, é descabido e contraria toda a lógica e o bom senso uma vez
que se sabe que a presença deles no interior do prédio da Seção não representa,
em absoluto, sua labuta, essencialmente de natureza externa, ou contribui de
alguma forma para o bom andamento dos seus afazeres, consubstanciando-se essa
decisão em mera formalidade administrativa que se contrapõe aos interesses e
objetivos da própria instituição e de seu público alvo, além de ferir princípios norteadores da administração
pública, como o da finalidade, razoabilidade, interesse público e eficiência e
tornar o trabalho dos Oficiais de Justiça mais árduo e penoso.
Tal medida, instituída pela Portaria nº 515, de 14 de outubro de 2008,
da Direção do Foro da Seção Judiciária do RN, já foi objeto de Pedido de
Reconsideração à Direção do Foro e Recurso Administrativo e Reconsideração
também ao TRF5 por parte da ASSOJAF/RN, obtendo-se, incompreensivelmente, com
essas medidas resultados desfavoráveis a esses
servidores.
Ao contrário
do que muitos pensam, com o processo eletrônico os mandados em meio físico não
deixaram de ser emitidos na Justiça Federal. E continuam demandando
diligências variadas, dependentes de horários, condições de
trânsito/estacionamento, informações de estranhos, porteiros, funcionários,
familiares dos procurados, contato pessoal com os citando/intimandos, com
buscas, esperas e ausências, tudo no mundo real, não-virtual. Um lugar de cada
vez, uma tarefa de cada vez, como antes, mas só que em uma realidade nova,
agravada por dificuldades decorrentes do crescimento de uma cidade má
administrada como Natal. Exemplificando: ANTES do processo eletrônico: o Oficial
lotado em Natal precisava de meia hora para percorrer 30 km para cumprir um mandado
no bairro do Potengi. DEPOIS do processo eletrônico: o Oficial leva de uma hora
à uma hora e meia para percorrer os mesmos 30 km para cumprir esse mesmo
mandado. Por que? Porque o trabalho do oficial é presencial, mesmo que depois certifique
eletronicamente, porque o trânsito em nossa cidade está um caos e
permanentemente obstruído, entre outras razões.
Todos sabem que na última década a
grande Natal foi uma região que cresceu vertiginosamente, tanto em população
quanto geograficamente, com a criação
de novos loteamentos cada vez mais distantes do centro ou em direção aos
municípios limítrofes. Este crescimento desordenado gerou um grave
problema, o de transformar a nossa cidade numa das piores capitais em matéria
de mobilidade no trânsito, como também
gerou um aumento considerável no número de mandados para essas regiões
distantes, “aumentando” a área de atuação regular dos Oficiais de Justiça e,
conseqüentemente, o tempo utilizado no deslocamento até esses locais para
o cumprimento dos mandados.
Além disso, apesar da redução no número
de mandados simples, endereçados em pilhas aos órgãos públicos, localizados no
Centro da cidade, as diligências não foram reduzidas na mesma proporção. Exemplificando:
ANTES um Oficial entregava 200 mandados divididos em 05 órgãos públicos no
centro de Natal. DEPOIS do processo eletrônico não houve uma diminuição de 200
deslocamentos, mas apenas de 05 deslocamentos. A execução de tais mandados
requeria poucas diligências, pois em uma única diligência os Oficiais de Justiça
cumpriam dezenas de mandados em razão de serem mandados repetitivos e de mínima
complexidade. De forma que, com a eliminação estatística destes mandados de
mínima complexidade, os mandados de média e alta complexidade passaram a ser
dominantes na distribuição aos Oficiais de Justiça.
Hoje, estatisticamente, o número de
mandados é ainda próximo aos números anteriores a essas transformações, situação
esta agravada pela mudança no grau de complexidade dos mandados, que resultou
num aumento da distribuição dos mandados de média e alta complexidade, como já
dito, que requerem muito mais tempo para serem cumpridos, acrescentando-se a
esta nova realidade a execução de rotinas internas criadas para os Oficiais de
Justiça que demandam mais tempo como: lançamento de recebimento, certificações,
conferência eletrônica, lançamento de devoluções, e outras rotinas que antes
não existiam.
Também merece menção o fato da mudança
do perfil dos usuários da Justiça Federal na última década. As demandas na
Justiça Federal tinham um perfil mais elitizado, havia poucas subseções e o
“cidadão comum” por falta de acesso pouco demandava. Assim, nesses últimos dez
anos houve uma grande evolução da prestação jurisdicional na Justiça Federal e
a partir daí, é possível identificar alguns elementos importantes que criaram
novas e mais demandas de alta complexidade para o trabalho dos Oficiais de
Justiça.
Assim, hoje, o Oficial de Justiça
trabalha levando em conta o lado social da situação: lida com pessoas
desvalidas, doentes, interditadas, a quem não pode apenas solicitar para que
assine um mandado. Se antes já lhe era necessário ter paciência, firmeza e jogo
de cintura, agora é exigido muito mais tempo nestas situações, na maioria das
vezes não só lendo o mandado, mas explicando pormenorizadamente a demanda em
face da fragilidade destes “novos” jurisdicionados.
Desta forma,
não é aceitável que, diante de toda esta situação, o Oficial de Justiça ainda
tenha a lhe dificultar a sua rotina de trabalho a obrigatoriedade do
deslocamento diário ao prédio da JFRN para tão somente comprovar sua freqüência
através do ponto eletrônico, até porque existem nos sistemas de processos utilizados
nas Varas rotinas/relatórios que permitem saber, entre outros identificadores
relativos à sua atividade, o número de mandados que foram cumpridos, que se
encontram na sua posse e o tempo que estão sem cumprimento, aferindo-se
perfeitamente desta forma, pelo próprio trabalho realizado, a sua “freqüência”
ao trabalho. Ademais, continua
vigorando a prática dos atestados dos diretores de secretaria que ainda são
entregues até o dia 05 de cada mês ao Setor da Folha de Pagamento, certificando
os dias trabalhados pelos Oficiais de Justiça para fins de pagamento da
indenização de transporte, em consonância com resolução do CJF, caracterizando,
assim, a nosso ver, duplo controle de freqüência sobre esses servidores.
A Casa da Justiça JFRN estará fazendo jus
a este nome em sua plenitude quando tratar seus próprios servidores de maneira
tal e qual às palavras de Ruy Barbosa sobre o que é justiça: “tratar
desigualmente os desiguais, na medida das suas desigualdades”. São, os Oficiais de Justiça, servidores desiguais, pela
própria natureza externa do seu trabalho. Merecem tratamento desigual.
Oficiala
de Justiça*
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