Por Boanerges Cezário*
Há algum tempo trabalho
numa vara privativa de Execução Fiscal e certa vez assumi a tarefa de Administrador Judicial ad
hoc de uns grupos empresariais acusados de envolvimento com lavagem de dinheiro.
Como o Direito não pode
ser concebido, nem pensado de forma linear, aprendi que há um elo muito forte entre as ações penais que apuram
lavagem de dinheiro e execuções fiscais.
É comum, após o início
da Ação Penal apurando ilícitos relativos a lavagem de dinheiro evidenciar-se
de pronto um alto nível de inadimplência
das empresas investigadas, que raramente possuem patrimônio sólido
garantidor de suas operações escusas.
A solução mais prática
sempre será a remoção e venda judicial dos bens
sequestrados naquelas ações, preocupação agora sanada com a vigência da lei
12.683/2012.
O que chama a
atenção é que mesmo vendendo os bens adquiridos ilicitamente, persiste ainda o alto índice de endividamento dos
empreendimentos, em face da ausência de capital de giro, de altas dívidas no
sistema financeiro, da falta de
financiamento bancário e da carência de credibilidade das empresas,
dentre outros fatores principalmente se os sinais de lavagem são muito
escancarados.
De imediato, constata-se
insolvência dos empreendimentos, pois com patrimônios pífios a venda perseguida
não cobre as dívidas deixadas e surgidas por empresas que operam assim, pois é
esse um dos objetivos, manipular somas altas de dinheiro sem pagar obrigação
nenhuma, principalmente as tributárias.
Além dos fatores acima
elencados, aparecem ações judiciais diversas, ocasionando o aumento do passivo com cobranças várias, quais sejam Reclamações
Trabalhistas, Execuções Fiscais, Monitórias, despejo, dentre outras.
Nesse patamar, surgem
também diversos credores iludidos, famintos em abocanhar um patrimônio ínfimo, que só fazem aumentar na verdade as taxas
de congestionamento processuais nos Tribunais,
posto que as empresas administradas, antes mesmo da intervenção judicial, há muito tempo carregam veementes sinais de
insolvência, sendo a falta de
recolhimento de tributos um dos indicadores.
Alguns credores ajuízam
ações contra as empresas acusadas em operações de lavagem de dinheiro como se
tais negócios solventes fossem, sem qualquer sinal de patrimônio para cobertura.
Perante tais situações,
forçoso é concluir que se torna racional
a decretação da Falência de tais empreendimentos, sendo necessário providências
informadoras aos credores de tais
evidências para que requeiram judicialmente
a respectiva decretação judicial da insolvência dos empreendimentos,
aplicação elementar do princípio da
economia processual.
Paralelamente aparecem
Execuções Fiscais contra tais empresas , cujos valores cobrados sempre já iniciam
na casa dos grandes devedores
Seria interessante que
a Fazenda Pública, com a devida vênia, inovasse no seu modus operandi, requerendo judicialmente
a decretação judicial de Falência dessas
empresas de fachada.
A ideia faz sentido,
pois anualmente continuarão surgindo novas execuções contra a empresas , haja
vista que a formalização da baixa na forma da lei nunca será providenciada
pelos sócios desses empreendimentos de araque, pois não é do interesse deles.
Num Seminário realizado
sobre Execução Fiscal na Justiça Federal do Rio Grande do Norte em abril de
2012 uma palestra chamou atenção, que
foi a do Juiz Federal George
Marmelstein, quando o mote da
exposição foi mostrar que Grupos são abertos pelas mesmas pessoas executadas
em outros processos para continuarem operando e fraudando. Isso acontece, pois
é o que se vê na prática, tanto pelos
empresários que fraudam só o fisco, como também com os que lavam dinheiro.
Um ponto de reflexão é
indagar-se sobre o porquê das Fazendas Públicas não requererem a Falência
dessas empresas que são insolventes.
Não optando por tal
estratégia, as Execuções de empresas insolventes, como as que se envolvem em
ilícitos e lavagem, se transformam em processos longos e que no mínimo
repousarão cinco anos nas prateleiras da Justiça ou se for virtual nos HDs do
computadores.
Empreendedores desse
naipe, ou seja, que abrem empresas e as abandonam porque não sofrem quaisquer
restrições cadastrais em seus nomes e continuam operando em novos grupos e a Justiça
continua a receber Execuções Fiscais contra devedores insolventes como, repito,
se solventes fossem.
A teoria do Juiz George
Marlmestein é agasalhada na jurisprudência e não é outro o entendimento dos
Tribunais. Como prova disso, vejamos o que pensa a Ministra Nancy Andrighi:
REsp 1259018 / SP
RECURSO ESPECIAL 2010/0065925-4 |
Relator(a)
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Ministra NANCY ANDRIGHI (1118)
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Órgão Julgador
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T3 - TERCEIRA TURMA
|
Data do Julgamento
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09/08/2011
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Data da Publicação/Fonte
|
DJe 25/08/2011
RT vol. 915 p. 437 |
Ementa
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PROCESSO
CIVIL. FALÊNCIA. EXTENSÃO DE EFEITOS. SOCIEDADES COLIGADAS.
POSSIBILIDADE.
AÇÃO AUTÔNOMA. DESNECESSIDADE. DECISÃO INAUDITA
ALTERA
PARTE. VIABILIDADE. RECURSO IMPROVIDO.
1.
Em situação na qual dois grupos econômicos, unidos em torno de um
propósito
comum, promovem uma cadeia de negócios formalmente lícitos
mas
com intuito substancial de desviar patrimônio de empresa em
situação
pré-falimentar, é necessário que o Poder Judiciário também
inove
sua atuação, no intuito de encontrar meios eficazes de
reverter
as manobras lesivas, punindo e responsabilizando os
envolvidos.
2.
É possível ao juízo antecipar a decisão de estender os efeitos de
sociedade
falida a empresas coligadas na hipótese em que,
verificando
claro conluio para prejudicar credores, há transferência
de
bens para desvio patrimonial. Inexiste nulidade no exercício
diferido
do direito de defesa nessas hipóteses.
3.
A extensão da falência a sociedades coligadas pode ser feita
independentemente
da instauração de processo autônomo. A verificação
da
existência de coligação entre sociedades pode ser feita com base
em
elementos fáticos que demonstrem a efetiva influência de um grupo
societário
nas decisões do outro, independentemente de se constatar
a
existência de participação no capital social.
4.
Na hipótese de fraude para desvio de patrimônio de sociedade
falida,
em prejuízo da massa de credores, perpetrada mediante a
utilização
de complexas formas societárias, é possível utilizar a
técnica
da desconsideração da personalidade jurídica com nova
roupagem,
de modo a atingir o patrimônio de todos os envolvidos.
5.
Recurso especial não provido.
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O questionamento,
repita-se, que se faz aqui é: por que as
Fazendas Públicas na forma do inciso IV,
art. 97, da lei 11.101/2005 , não
requerem a Falência dessas empresas entulhadoras de prateleiras e escaninhos?
Acredito que só no
processo Falimentar tais empreendedores de fachada sairiam do mercado, pois os
efeitos da decretação os afastariam também
de quaisquer atividades empresariais, evitando novas aberturas de
empresas pelos mesmos empresários do tipo muçum ( espécie de peixe
desprovida de escamas, difícil de pegar exatamente por ser escorregadio)
Fica a ideia .
*Oficial
de Justiça/Administrador Judicial ad hoc